12/05/2025 | Press release | Distributed by Public on 12/05/2025 17:56
É uma alegria rever tantos rostos familiares, tantos amigos, tantas pessoas e personalidades que emprestaram seu trabalho, talento e dedicação à construção viva do Itamaraty.
Encerramos hoje o ciclo de comemoraçõesdos 80 anos de fundação do Instituto Rio Branco (IRBr).
Nada mais oportuno do que fazê-lo aqui, no Palácio do Itamaraty do Rio de Janeiro, onde teve início essa história.
Fiz, aqui no Rio de Janeiro, o meu Curso de Preparação à Carreira Diplomática, na Turma de 1973-1974, em um grupo relativamente pequeno, ao lado de mais dezoito colegas.
Guardo com especial apreço os anos de formação no Instituto, então dirigido pelo Embaixador Alfredo Valladão, a quem evoco com a lembrança de seu amor por Eça de Queirós: Alfredo Valladão dizia invejar quem ainda não tinha lido toda a obra de Eça de Queirós (era o meu caso), por ainda ter pela frente a aventura da descoberta de novos livros e textos do grande escritor português.
Tive o privilégio de aprender com o diretor Geraldo Eulálio do Nascimento Silva e com professores como Bertha Becker, Vicente Tapajós e Alberto Venancio Filho.
Mais tarde, com sua transferência para Brasília, há cinquenta anos, o Instituto continuou a se reinventar, ampliando sua missão e consolidando uma identidade própria, sem desmanchar os laços com sua origem e com suas melhores tradições.
É essa combinação de memória e renovação que molda, ainda hoje, a vitalidade do Instituto e distingue a formação dos diplomatas brasileiros.
MODERNIZAÇÃO DO MRE - PASSADO
A história do Itamaraty moderno e a do Instituto Rio Branco são indissociáveis. E a trajetória de nossa academia diplomática se entrelaça com o aperfeiçoamento institucional do Estado brasileiro.
A criação do Instituto Rio Branco, em 1945, no governo Vargas, coincidiu com o movimento de reorganização do Estado moderno, empenhado em dotar o país de um serviço público cada vez mais profissional, especializado e orientado a perseguir o interesse nacional.
Fundado no centenário de seu patrono, o Instituto inseriu-se na vanguarda institucional que marcou aquele período, ao lado de iniciativas estruturantes como a criação do Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP), em 1938; da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em 1944; do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), em 1951; do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), em 1952; do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), em 1955; e da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), em 1956.
A memória dessa época se confunde com a de inúmeras personalidades que, formadas pelo Instituto, levaram seu conhecimento para os mais diversos domínios da vida social, política e econômica de nosso país.
Ao recordar as primeiras turmas do Instituto, evoco figuras como a de Gilberto Chateaubriand, Celso de Souza e Silva, Alcindo Carlos Guanabara, Octavio Berenguer Cesar, Hélio Antônio Scarabotolo e Marcos de Souza Dantas Romero, dentre outros dos 27 integrantes da turma pioneira de 1945.
Por sua notável trajetória de mecenas e difusor da arte brasileira, nada mais apropriado que homenagear Gilberto Chateaubriand no Concurso de Arte Contemporânea, que leva seu nome, criado nesta atual gestão do Ministério das Relações Exteriores.
O Concurso anual busca incentivar a produção brasileira de artes visuais de jovens artistas e ampliar sua divulgação, no Brasil e no exterior, como instrumento da diplomacia cultural brasileira.
Recordo também o exemplo dos embaixadores Antonio Patriota, Celso Amorim, Luiz Alberto Figueiredo Machado, Luiz Felipe de Seixas Corrêa, Luiz Felipe Lampreia e Samuel Pinheiro Guimarães, fonte de inspiração a sucessivas gerações de diplomatas.
A CONTRIBUIÇÃO DAS MULHERES DIPLOMATAS
A presença feminina no Itamaraty - iniciada em 1918 por Maria José de Castro Rebello Mendes - constitui um dos pilares estruturantes de nossa evolução institucional.
Ao homenagear as gerações que nos antecederam no concurso do Instituto Rio Branco, devemos também celebrar o legado de tantas mulheres que, com coragem e persistência, transformaram a diplomacia brasileira em uma carreira mais diversa, representativa e meritória.
Celebrando a quebra de barreiras, destaco Thereza Quintella - a primeira mulher a dirigir o Instituto Rio Branco.
Tenho a alegria de destacar, ainda, nossa Secretária-Geral, a Embaixadora Maria Laura da Rocha, cuja liderança tem sido fundamental nessa trajetória de renovação, bem como as Secretárias que vêm chefiando áreas cruciais do Itamaraty, como a Embaixadora Gisela Padovan, Secretária de América Latina e Caribe; a Embaixadora Marcia Loureiro, Secretária de Comunidades Brasileiras e Assuntos Consulares e Jurídicos; a Embaixadora Susan Kleebank, Secretária de Ásia e Pacífico; e a Embaixadora Maria Luisa Escorel.
O legado de excelência e de ampliação da representatividade feminina se projeta ainda em nomes como das embaixadoras Vera Pedrosa, Heloísa Vilhena e Maria Stela Pompeu Brasil Frota - a quem perdemos recentemente e a quem presto minha sentida homenagem -, além das ex-diretoras-gerais do Instituto, Gisela Padovan e Glivânia Oliveira, e da atual diretora, Mitzi Gurgel Valente da Costa.
Não posso deixar de mencionar, ainda, a Embaixadora Maria Luíza Viotti, chefe da Embaixada do Brasil em Washington e antiga Representante Permanente do Brasil junto às Nações Unidas e ex Chefe de Gabinete do Secretário-Geral das Nações Unidas por cinco anos.
Foram os avanços consolidados por essas conquistas que permitiram, entre outros progressos, que quatro diplomatas mulheres liderassem o Instituto Rio Branco ao longo dos últimos seis anos - conduzindo-o a um período de maior diversidade e de renovado alinhamento com as necessidades da política externa brasileira.
ALUNOS ESTRANGEIROS
O Instituto também construiu, ao longo de décadas, laços profundos com alunos estrangeiros, de todos os continentes, em especial da CPLP e América Latina.
Desde 1976, passaram pelo Instituto mais de 300 diplomatas estrangeiros, de todos os continentes - em especial alunos oriundos da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e de nossos vizinhos da América Latina - reforçando o caráter universalista de nossa política externa.
Em números de 2024, 44% desse total vieram da África, e 42% da América Latina e Caribe, o que mostra a vocação do Instituto para a cooperação no entorno estratégico do Brasil, aquém e além-mar.
É motivo de orgulho que cinco chanceleres estrangeiros tenham sido formados em nossa escola diplomática: dois de São Tomé e Príncipe e um do Equador, um Haiti e um do Suriname.
MODERNIZAÇÃO DO MRE - PRESENTE
Há oitenta anos assumimos a vanguarda do funcionalismo público, ao criar uma casa de excelência que passou a abastecer anualmente o Itamaraty e outros ministérios com quadros altamente qualificados.
Isso não é desconhecer muitas carências só sanadas muitas décadas depois.
Penso, por exemplo, no fato de que só na virada para o século XXI os diplomatas passaram a tomar posse como Terceiros Secretários logo no início do Instituto Rio Branco, o que lhes propiciou melhores condições materiais durante o curso.
Até então, aqueles que podiam cursavam o Rio Branco amparados por suas famílias, o que evidentemente representava uma barreira para candidatos menos favorecidos.
Também na virada para o século XXI é que se tomou a iniciativa de instituir um Programa de Ação Afirmativa, com vistas a fazer o Ministério refletir mais fielmente a sociedade brasileira e se apropriar com orgulho da riqueza de sua diversidade.
A transformação em termos de inclusão social e racial se deu com o Programa de Ação Afirmativa - Bolsa-Prêmio de Vocação para a Diplomacia, lançado em 2002, como o primeiro passo concreto do MRE para promover maior igualdade de oportunidades e diversidade étnico-racial. Desde a criação do programa, mais de 800 bolsas foram concedidas.
Nos últimos anos, assumimos o compromisso de ampliar a representatividade e democratizar o acesso à carreira, por meio de iniciativas voltadas a candidatos pardos e indígenas.
Dos 1.595 diplomatas em atividade, menos de 18% se declaram pardos, pretos, amarelos ou indígenas.
Os dados mais recentes sobre a composição étnico-racial da carreira demonstram que avançamos na inclusão de novos rostos na diplomacia brasileira, embora nos falte um longo caminho a percorrer.
Entre os alunos e os recém-egressos do Instituto Rio Branco, as políticas afirmativas começam a produzir resultados concretos: entre os atuais terceiro-secretários, mais de um terço se identifica como não branco.
Não menos relevantes são as medidas destinadas a promover maior equilíbrio de gênero no Ministério.
Entre 1946 e 2025, formaram-se no Instituto Rio Branco 2.489 diplomatas brasileiros, distribuídos em 86 turmas.
Desse total, 20% - 502 colegas - são mulheres.
Embora a média mais recente seja de 23%, o número de 20% reflete o período em que vigorou a proibição formal de ingresso de mulheres na carreira diplomática, entre 1945 e 1954.
Há que observar que, revertida essa proibição, vigorou por muitos anos a prática chamada "agregação", de acordo com a qual só um dos membros de um casal de diplomatas podia atuar no exterior, ficando o outro limitado a atividades domésticas: eram as diplomatas mulheres que tinham a sua carreira desfavorecida por ficarem "agregadas" no posto.
Temos a satisfação de notar que, após medidas afirmativas adotadas desde 2024, o número de mulheres nas novas turmas do Rio Branco vem ficando acima da média de 23%: 32% no ano passado e 42% neste ano.
MODERNIZAÇÃO DO MRE - FUTURO
O Instituto Rio Branco se concentra hoje também em ampliar a representação indígena, em parceria com o Ministério dos Povos Indígenas e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), para concessão de bolsas de estudo para candidatos prepararem-se para o concurso.
Dessa forma, o Instituto atua como porta de entrada para a inovação no MRE, buscando formar quadros que reflitam o pluralismo e a diversidade da sociedade brasileira.
Sintomas de que estamos no caminho certo são os dados dos aprovados no Concurso de Admissão à Carreira Diplomática deste ano.
Dos 50 novos colegas a ingressar no Instituto Rio Branco, 42% são mulheres, sendo que sete das 21 aprovadas ingressaram pela ação afirmativa aplicada na primeira fase do Concurso.
Por meio dessas iniciativas, as novas turmas de diplomatas são cada vez mais plurais, abertas, democráticase inclusivas.
Trata-se de um trabalho em curso, mas seguiremos firmes na tarefa de promover a diversidade em nossa Casa.
Estou convencido de que essa diversidade, esse amálgama de cores, raças, gêneros, crenças e ideiasfortalece nossa coesão institucional e aprimora a capacidade de cumprirmos nossa missão profissional mais essencial: defender os interesses nacionais com sobriedade e fidelidade às melhores tradições diplomáticas brasileiras.
Convertido em referência mundial entre as escolas diplomáticas, na companhia de casas de excelência como as academias diplomáticas do Vaticano e da Áustria - que disputam entre si a primazia da antiguidade nesse ramo - o Rio Branco hoje forma quadros para um mundo desafiador e complexo.
POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA - ATUALIDADE
Retomamos, desde 2023, uma fase de reconstrução da credibilidade internacional do Brasil.
A presidência brasileira do G20, a Cúpula da Amazônia, a Cúpula Brasil-Caribe, a presidência do BRICS, a realização da COP30 e a liderança no MERCOSUL projetaram globalmente a visão brasileira de desenvolvimento sustentável, justiça social e reforma da governança internacional.
Iniciativas como a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) e o Chamado à Ação pela Reforma da Governança Global refletem esse compromisso.
Nada disso seria possível sem os dedicados e competentes quadros do Itamaraty e sem a sólida e reconhecida formação oferecida pelo Instituto Rio Branco, que ano que vem completará 50 anos de sua transferência para Brasília, sem que fosse alienado o compromisso institucional com a qualidade e profissionalismo de seu corpo docente e discente.
A cada grande evento, missão ou negociação, o trabalho silencioso, diligente e comprometido de egressos e alunos do IRBr tem sido decisivo para reafirmar o protagonismo internacional do Brasil.
FECHAMENTO
O também diplomata Vinícius de Moraes dizia que "a vida é a arte do encontro".
O Instituto Rio Branco tem sido, ao longo de oito décadas, um espaço privilegiado de encontros: entre gerações, entre tradição e modernidade, entre a diversidade do Brasil e a missão permanente de nossa diplomacia.
Celebrar os 80 anos do IRBr é celebrar esse encontro permanente - que nos renova, nos inspira e nos une.
É, igualmente, compreender que temos que estar à altura das demandas da diplomacia do século XXI.
Estou muito feliz por partilhar este momento com todos aqui presentes e desejo ao Instituto muitos aniversários, muitos reencontros e muitos novos capítulos dessa história que nos honra a todos, e muito especialmente o Brasil.
Muito obrigado.